DIREITO E PAIXÃO(Textos extraídos)Luís Roberto Barroso O pensamento intelectual e, mais notadamente,

o pensamento jurídico, por longo tempo, guardou-se isolado numa auto-suficiência excludente, que limitava o seu objetivo e, de certo modo, amesquinhava o conhecimento que produzia. O formalismo e o positivismo jurídicos, sem embargo de sua justificação histórica contribuíram para este quadro, que talvez pudéssemos chamar de narcisismo científico.
O Direito, como forma de expressão humana, envolve criação, sentimento, estilo. Ao lado de sua vocação pragmática, voltado para a realidade e a solução de problemas, o Direito existe, também, para satisfazer ao espírito, para ser bonito, para acenar ao dia seguinte. Por trás das ortodoxias sisudas e dos formalismos caricatos, Direito também é arte.
Em passagem bem inspirada, citada por Ferrara, constatou lhering que “com um saber moderado pode-se ser um jurista distinto; e nunca chegar a sê-lo, tendo-se, embora, um conhecimento vastíssimo”. É que por trás do saber objetivo, existe uma dimensão subjetiva: quem professa o conhecimento, em nome de quem, para atender que desígnios? Também o Direito – ou, sobretudo o Direito – está no domínio dos sentimentos e das paixões.
Remarque-se que não se vai proceder à análise da paixão no Direito, ou seja, as hipóteses em que a norma jurídica acolhe o elemento paixão, seja para neutralizá-la, estimulá-la ou incriminá-la. A paixão está dentroda norma, por exemplo, quando a lei penal permite a redução da pena em um terço quando o crime de homicídio é cometido “sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima” (C. Penal, art. 21, § 1º). Ou quando permite ao cônjuge impugnar a doação feita pelo outro ao amante (C. Civil, arts. 1.177 e 248, IV). Ou quando considera adiantamento da legítima a doação dos pais a um dos filhos (art. 1.171).
A paixão aqui considerada é a que move o cientista, o intérprete ou os operadores do Direito, seja na sua elaboração doutrinária, seja na compreensão da norma, seja na atuação em casos concretos.
Conceptualmente, a questão do direito de ação não sofre alteração ontológica quando transportada para o plano penal. Próprio dos Estados civilizados é o monopólio do uso da força e do poder de administrar a justiça. Por via da ação penal, o Estado-Administração exerce, perante o Estado-juiz, o poder-dever de reprimir as infrações penais. Aos acusados, por sua vez, são assegurados direitos subjetivos diversos, dentre os quais o do devido processo legal, abrangendo, dentre outros, o direito de defesa e o contraditório.
Ao trafegar pelo Direito, em plano científico, é preciso atentar para duas dimensões distintas: de um lado, é preciso conhecer-lhe o instrumental teórico, os princípios, os conceitos e os mecanismos de atuação. A ignorância não é boa conselheira e induz antes ao preconceito que à participação transformadora. De outra parte, é preciso perceber o papel político-ideológico do Direito, questionar a quem ele serve e que interesses promove. Sem essa percepção crítica, o conhecimento se burocratiza e se amesquinha.
Há, assim, uma fusão indissolúvel, e aparentemente esquizofrênica, que impõe ao jurista verdadeiro fazer ciência e fazer política. De um lado, o discurso científico, dogmático, positivo. De outro, a compreensão do papel ideológico e institucional do Direito.
A linguagem do Direito há de conformar-se aos rigores da técnica jurídica. Mas sem desprezo à clareza, à transparência, à elegância e ao ritmo melodioso da poesia. As palavras, para o Professor, para o advogado, para os operadores do Direito, em geral, são feitas para persuadir, demover, incentivar. Não basta sintaxe. Não basta ortografia. Não basta semântica. É preciso paixão.

Questões:
1) Concepção de direito contida no texto.
2) Concepção de paixão contida no texto.
3) Relação Direito e Política.
4) Dê respostas possíveis às questões elevadas no 3º parágrafo.

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